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Literatura Italiana Traduzida ISSN 2675-4363
Helena Bressan Carminati
Primo Levi
Resenha
em
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O escritor italiano Primo Levi (1919-1987), como já visto em uma postagem anterior, possui uma vasta produção literária e parte dela traduzida no Brasil, com exceção de seus poemas. Dentre suas obras traduzidas, temos a mais recente, intitulada A chave estrela que chegou até o público brasileiro em 2009. Publicada na Itália em 1978 com o título La chiave a stella, a obra apresenta ao leitor uma série de pequenas narrativas que dão forma a um romance. O enredo é construído a partir do olhar do personagem químico que é o narrador e relata as histórias e aventuras contadas a ele por Faussone, jovem italiano montador que vê em seu trabalho uma razão para viver.
A narrativa se constitui, em sua maior parte, por discursos diretos entre os dois personagens, possuindo uma linguagem bastante peculiar, visto que a língua de Faussone é bastante técnica e envolve suas vivências no mundo da engenharia, o que faz com que a narrativa tenha de acompanhar e retratar seu modo de expressão. O livro é dividido em 14 capítulos que se entrelaçam através do modo com que as histórias são narradas. A partir dos diálogos, o protagonista, ou o narrador, anunciam temas dos capítulos posteriores e recuperam experiências já contadas anteriormente. Desse modo, apesar de serem histórias independentes o romance pertence a uma cornice em comum que é sempre retomada através do tema principal: o trabalho. Nesse sentido, Faussone possui um olhar bastante interessante a respeito deste tema, pois acredita no trabalho criativo para a realização dos homens, o que pode ser observado em sua fala no capítulo “A Dupla Cônica”:
[...] O termo “liberdade” tem notoriamente muitos sentidos, mas talvez o tipo de liberdade mais acessível, mais degustado subjetivamente e mais útil ao consórcio humano coincida com o fato de o indivíduo ser competente no próprio trabalho e, portanto, de sentir prazer ao executá-lo. (LEVI, 2009, p. 161)
Nestas páginas, Levi trata o tema do trabalho sob uma perspectiva humanizadora, e por sua vez, diferente de seu primeiro livro É isto um homem? (publicado na Itália em 1947), em que ele narra sua experiência no campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, onde o trabalho era visto como uma ferramenta de aniquilação dos prisioneiros, pois era tido como uma maneira de apagamento da identidade e das subjetividades dos que lá estavam, pois homens se transformavam em não-homens ou apenas “coisas”, objetos, como pode ser observado no seguinte trecho da obra: “Já não existe vontade; cada pulsão torna-se passo, contração reflexa dos músculos destruídos. Os alemães conseguiram isso. Dez mil prisioneiros, uma única máquina cinzenta; estão programados, não pensam, não querem. Marcham” (LEVI, 2000, p. 50). Assim, os prisioneiros sobreviviam apenas como engrenagens de um sistema aniquilador maior, e se tornavam não-homens com o passar dos dias, eram como produtos fabricados em série.
Desse modo, é interessante pensar que embora É isto um homem? traga esta perspectiva do trabalho forçado e da realidade do Campo, em A chave estrela, obra publicada 31 anos mais tarde, o trabalho se apresenta como redentor e libertador, visto que é um trabalho criativo, que permite ao trabalhador ter sua independência e com ela usufruir da liberdade humana. Portanto, é uma leitura que pode trazer reflexões acerca da produção literária de Levi e de como o autor trata a concepção de trabalho, nesta obra que é uma ficção, mas que não deixa de ter relações com sua experiência como prisioneiro da Segunda Guerra.
*Para uma outra leitura de A chave estrela, também sob a perspectiva do trabalho, é interessante a leitura do texto O trabalho: a chave para a liberdade de Andréia Guerini e Patricia Peterle que pode ser encontrado no seguinte link: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-106X2009000100015.
Referências:
LEVI, Primo. A chave estrela. Trad. Maurício Santana Dias. São Paulo: Companhia das letras, 2009.
LEVI, Primo. É isto um homem?. Trad. Luigi del Re. Rio de Janeiro: Rocco, 2000.
como citar: CARMINATI, Helena Bressan. O trabalho liberta? Uma leitura de "A chave
estrela" de Primo Levi. In Literatura Italiana Traduzida, v.1., n.3,
março. 2020. Disponível em https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/209918
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