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Imagem: pxhere.com |
In occasione del Centenario della nascita di Leonardo
Sciascia (1921-2021)
Considerado um dos mais
importantes escritores do Novecento italiano,
Leonardo Sciascia, que fez de todos os seus livros um livro sobre a Sicília,
nasceu em 1921, em Racalmuto – um comune siciliano da província de
Agrigento – e morreu em Palermo, em 1989. Intelectual umanista e scomodo, Sciascia atuou também como político e
professor. Grande crítico da realidade insular, se destacou como escritor impegnato, pelas suas denúncias contra o
poder.
Dentre as seis palavras
escolhidas[1] para a comemoração oficial
do Centenario della nascita di Leonardo
Sciascia, no ano de 2021, estão as palavras “pane” e “terra”, junto às outras palavras-chave: “donne”, “mistero”, “diritto” e “giustizia”,
as quais Sciascia considerava as mais significativas para a sua vida, sendo as quatro
primeiras ligadas à esfera dos sentimentos e as duas últimas, à esfera da razão.
Cada uma delas possui dentro da produção literária do autor um destaque dentro
das temáticas por ele desenvolvidas em seus livros. São ramificações de
assuntos que se desenvolvem em temas relacionados à Sicília de sua época, sob
sua visão crítica e comprometida com questões sociais e políticas. Para este
texto, escolhi as palavras “pane” e “terra” a fim de explicitar a forma como
Sciascia se relaciona com a temática do cibo,
seja de forma crítica, evidenciando o alimento como uma preocupação política e
social da Sicília ou como forma de expressão da identidade siciliana, em sua
relação com a culinária típica da região.
Na literatura,
destacando-se a italiana, sabemos que trechos em que a comida se evidencia como
traço identitário remetem à forte ligação à terra e à cultura da região.
Conforme afirma BONA (2001, p. 15) “(...) para o povo italiano, a ‘ciência’ do
bem comer e o instinto plenamente desenvolvido, mantidos através dos hábitos
alimentares seculares, é de fácil percepção na crônica de seus escritores, de
seus críticos sociais.” Ainda foram pouco exploradas essas representações dos
hábitos alimentares dos sicilianos e da “ciência do bem comer” na produção
literária sciasciana. Encontrei apenas um artigo científico e um livro[2] que abordam essa questão em
referência aos romances do autor. No artigo de Ricciarda Ricorda, “Pane e
coltello – Leonardo Sciascia e il cibo”, a pesquisadora aborda a temática do cibo em Sciascia em três níveis
diferentes: no do campo sociológico-antropológico, em que a abordagem à comida
implica uma sensação de escassez, indicando um status social desfavorecido; no do campo da memória e no do campo
emocional. O livro de Salvatore Vullo, Di
terra e di cibo – Fra le pagine di Leonardo Sciascia, que é dividido em
duas partes, trata, em geral, da ligação de Sciascia com a civiltà contadina. Na primeira parte, o autor aborda as referências,
nos textos de Sciascia, à Sicília agrícola dos anos 40 a 60. Na segunda, Vullo apresenta
um compilado de ricette sciasciane, com
pratos citados pelo escritor em seus textos literários ou pratos que Scascia
gostava de preparar em sua casa na contrada
Noce.
Destacaremos, neste
texto, a temática do cibo em Leonardo
Sciascia em duas perspectivas diferentes: pela visão que Sciascia dedicou ao
assunto enquanto crítica social e pela memória afetiva que amigos e parentes
têm de Sciascia em sua relação com a culinária siciliana. Na primeira, explorando
as referências em seus romances - pouco notadas em trabalhos de pesquisa - à
culinária siciliana. Referências que, embora ocorram em quantidade
significativa em sua produção literária, notamos que muitas delas não escapam
de seu impegno etico-sociale. Em um
de seus títulos mais significativos, Le
parrocchie di Regalpetra (1956), Sciascia fala de comida, mas também da
fome, colocando em evidência a presença da comida, assim como a ausência dela. Para
a segunda, apresento uma breve entrevista a Vito Catalano, um de seus netos, - concedida
a mim por e-mail - a partir da sua colaboração com o recente lançamento de uma
biografia gastronômica sobre seu avô, de autoria de Lillo Alaimo Di Loro.
Pane e fame
O escritor siciliano fala
de comida, em Le parrocchie di Regalpetra,
quase sempre em um contexto de representação da miséria na Sicília dos anos 50,
ancora una terra amara[3],
narrando as condições degradantes de vida dos zolfatari, salinari e de seus alunos da escola em que dava aula:
Non ho
mai letto niente di più triste nelle cronache, spesso desolate, che i ragazzi
mi fanno delle loro giornate. Vedo la casa, umida e scura in quel quartiere di
San Nicola che è il più povero del paese; il ragazzo piangente (e magari avrà
avuto un ceffone e qualche cattiva parola) per quelle duecento lire che si era
buscate al giuoco e che voleva spendere chi sa come, magari per avere i
quaderni e la penna; e il padre che se ne va a farsi il bicchiere, ad ubriacarsi con i poveri quattrinello del suo
bambino. Mai, come attraverso questo picolo fatto, la miseria mi è apparsa in tutta
la sua essenza di cieca e maligna bestialità. A guardar bene, ci sono
nell’episodio tutti gli elementi che fanno la tragedia della nostra vita – e
almeno della mia vita qui, in questo povero paese. Ed il giorno della grande
festa cristiana, che fa da sfondo e condiziona l’episodio, pare diveni, dietro
questo bambino che piange nella sua casa oscura, una blasfema parodia. (SCIASCIA, 1991, p.194-195)[4]
Nesse contexto, num
cenário de uma Sicília ainda bastante pobre, cuja escassez de outros alimentos
é evidenciada por Sciascia, a palavra pane
aparece com frequência, como símbolo da miséria:
Il
paese era distante dalla zolfara; il paese di Francesco Lanza, ma allora non
sapevo di Lanza, leggevo Hugo e Dumas padre. Un pomeriggio di domenica mio
padre mi lasciò andare in paese in compagnia di un capomastro, gli operai mi
fecero festa, vollero che prendessi gelati e dolci. Se ne stavano, indomenicati
nei loro vestiti scuri, a sedere fuori della stanza terragna che era il loro
circolo o, come si diceva, dopolavoro. L'indomani li avrei rivisti nella
zolfara con i pezzi di copertone legati ai piedi, il loro pane scuro – mangiamo pane e coltello – dicevano, come dire che mangiavano solo pane, al massimo
l'accompagnavano con l'acciuga salata o con un pomodoro. (SCIASCIA, 1991, p.50,
grifo nosso)[5]
Una
volta, prima del fascismo, i braccianti vennero per dare l’assalto alla scuola,
volevano bastonarci, e sì che allora molti di noi facevano la fame, chi non
aveva qualcosa di suo viveva a pane ed acqua con lo stipendio. (SCIASCIA,1991, p.127, grifo nosso)[6]
Percebe-se que o pão é a
base da alimentação desta terra, que, nos anos 50, ainda castigada pela
miséria, era um lugar onde qualquer alimento além do pão acenava como
indicativo de fartura:
L'alimentazione
di questi uomini (i salinari) è quasi esclusivamente costituita da idrati di
carbonio: pane e cipolla cruda o pane e
sarda salata nei due pasti che consumano sul posto di lavoro; la sera, a
casa, una minestra a base di pasta di scarto e verdure; la pastasciutta solo la
domenica (SCIASCIA, 1991, p.150, grifo nosso).[7]
Em uma nota, posta como
adendo ao capítulo “Cronache scolastiche”, Leonardo Sciascia discorre sobre as
refeições oferecidas aos alunos nas escolas da região, respondendo aos
comentários de seus leitores sobre essa questão e expondo sua visão de
professor sobre a aparente melhoria da situação econômica dos trabalhadores
locais:
D'altra parte, eguale consenso le cronache non riscossero tra i colleghi di
Regalpetra; qualcuno le trovò addirittura fantastiche: fenomeno abbastanza
comprensibile; qualche altro, pur trovandole vere nell'insieme, mi fece notare
che certi dettagli non corrispondevano alla realtà: il salario dei braccianti
agricoli oggi, non è di 600 ma di 700 lire al giorno; quello dei salinari di
600 e non di 500; e i ragazzi non portano più i sandali di legno con striscette
di cuoio, e alla refezione scolastica i ragazzi non tengono più come prima,
molti lasciano le scodelle piene, prendono il
pane e la marmellata e lasciano intatta la zuppa di fagioli o la
pastasciutta. Da quest'ultimo fatto il collega deduce che non c'è più la fame
di prima. Io non so se è da attribuire a sazietà o a invincibile disgusto il
fatto che le scodelle restino piene: può darsi siano migliorate, nelle
famiglie, le condizioni alimentati; ma è più facile sia stato il rancio
scolastico a peggiorare, che da disgustoso che era sia diventato addirittura
impossibile. Nel 54-55 io non ho frequentato la refezione; ma già negli anni
precedenti il rancio era tale che, ad entrare nell'aula dove veniva scodellato,
mi affiorava il cattivo pensiero che a farne ingollare un cucchiaino per
assaggio all'on. assessore regionale sarei stato felice, e in quanto
contribuente e in quanto maestro. Ogni centro di refezione assorbe l'attività
di un maestro, esclusivamente a questo servizio distaccato, e di quattro cinque
cucinieri e inservienti. Se invece di quella tremenda scodella di zuppa calda
l'assessorato pensasse di far distribuire una refezione meno evanescente di
biscotto e marmellata, o cioccolato, o formaggino, i ragazzi sarebbero felici;
e il dispendio notevolmente ridotto. E buona l'idea di una refezione calda: a
patto che la cosa calda risulti commestibile. C'è da sperare che il nuovo
assessore regionale per la Pubblica istruzione, invece di far circolari sul
saggio ginnico di staraciana memoria e sul canto obbligatorio dell'Inno a Roma
(quello che cantano i misini) come il suo illustre predecessore, cominci ad
occuparsi di cose più concrete, e anche della refezione. (SCIASCIA,1991, p.143-144, grifo
nosso)[8]
Nada escapa ao olhar
incômodo do escritor, nem mesmo a merenda escolar de seus alunos.
È
finito l'anno della scuola. Il direttore ci riunirà per il commiato, se Dio
vuole sarà l'ultima riunione, in un anno ne abbiamo una diecina, e ci sono poi
i cosidetti convegni che il provveditore vuole, discuterei problemi della
scuola, e i problemi della scuola sarebbero quelli della radio, del cinema.
Sarebbe imperdonabile far notare che qui c'è il problema del pane. Che c'entra il pane con la scuola? Parliamo della
radio. Parliamo del cinema. Del resto, tutto è come allora. (SCIASCIA, 1991,
p.142, grifo nosso)[9]
Vemos um Leonardo
Sciascia que se manifestava não apenas por meio das letras, mas também por meio
de ações práticas. Seu compromisso vai além da escritura, mostrando que a
dimensão de seu comprometimento transcende o campo da literatura. Assim como
vemos que seu incômodo não se limitava à recorrente temática da “máfia”, aquela
mais explorada quando se menciona o escritor.
Io
penso – se fossi dentro la cieca miseria, se i miei figli dovessero andare a
servizio, se a dieci anni dovessero portare la quartara dell’acqua su per le
scale lavare i pavimenti pulire le stalle; se dovessi vederli gracili e tristi,
già pieni di rancore; e i miei figli stanno invece a leggere il giornalino, le
favole, hanno i giocattoli mecanici, fanno il bagno, mangiano quando vogliono,
hanno il latte il burro la marmellata; parlano di città che hanno visto, dei
giardini nelle città, del mare. (SCIASCIA,
Leonardo, 1991, p.131-132, grifo nosso).[10]
Não é indiferente à
situação de vulnerabilidade alimentar em que se encontram algumas crianças de
sua terra, ainda que seus filhos dispusessem de uma variedade de alimentos e
tenham sido privados do trabalho infantil como aquele dos carusi nas zolfare sicilianas.
A insegurança alimentar,
temática que no Brasil retorna às manchetes dos jornais, em um retrocesso de
uma condição de fome e miséria que o país nunca deixou completamente - mas já
havia apresentado considerável avanço nesta questão - revela Sciascia como um
escritor com preocupações que transcendem um determinado território e uma
determinada época. Não por acaso, Leonardo Sciascia – mas não apenas por isso –
é considerado um autor ainda bastante atual. Tinha razão quando dizia acreditar
ser a Sicília a representação metafórica de todo o mundo.
A comida enquanto
expressão de identidade, no âmbito da exaltação gastronômica da cozinha
siciliana, também merece algumas considerações na produção sciasciana, embora
não tenham sido tão numerosas as menções à culinária típica da Sicília na sua
produção literária quanto as ocorrências encontradas nos romances de Andrea
Camilleri, por exemplo.
A escassa bibliografia que
aborda essa temática em referência à literatura de Sciascia ganhou, no entanto,
mais uma recente e significativa contribuição. Memórias afetivas de Leonardo
Sciascia à mesa foram avivadas com o lançamento
de La ragione del cibo. Leonardo
Sciascia a tavola – Conversazione
con Vito Catalano – (2021), de autoria de Lillo Alaimo Di Loro. O
título, resultado de um resgate da memória que um de seus netos tem de Sciascia,
na relação do escritor com a culinária siciliana, promete ser a primeira biografia
gastronômica do mestre de Racalmuto, mostrando um pouco de uma faceta de
Sciascia ainda pouco explorada: a de amante de boa culinária.
Nesse livro, podemos
acessar a imagem de um escritor um pouco diferente desta que permaneceu no
imaginário de seus leitores: a de um escritor sério, de ar severo e inclinado a
ter apenas visões pessimistas da vida. No livro de Lillo, as memórias que se evocam
de Sciascia é de um homem prosaico, alegre e que soube gozar e compartilhar a
vida com os amigos em sua casa de campo em Noce,
no território de Racalmuto, local onde a maior parte de seus livros foram
escritos. Alguns desses amigos eram os escritores Vincenzo Consolo e Gesualdo
Bufalino, além do fotógrafo Ferdinando Scianna, que iam visitá-lo e acabavam
saboreando os pratos preparados pelo próprio Sciascia.
Referências a pratos
típicos da Sicília que passaram despercebidos dos críticos literários em seus
romances também são relembradas, de forma a mostrar-nos um Leonardo Sciascia
menos soturno, além de nos direcionar a uma abordagem menos explorada em sua produção
literária, a do “cibo come “ambasciatore del paesaggio mediterraneo e della
civiltà contadina, importante chiave di lettura per comprendere le dinamiche
social e culturali di una sicilianità ancora da esplorare del tutto” (DI LORO,
2021, p.6). [11]
Com o objetivo de explorarmos
um pouco este assunto, que foi possível de ser abordado a partir da visão de
parentes e amigos próximos do escritor, entrevistei Vito Catalano (1979), um
dos netos de Leonardo Sciascia, que assim como seu avô, também exerce o ofício
de escritor, sendo autor dos romances: L'orma del lupo (2010), Il
vicerè giustiziere (2011), La
sciabola spezzata (2013), Il pugnale
di toledo (2016), La notte della
colpa (2019) e Il conte di Racalmuto
(2021).
Breve intervista allo
scrittore Vito Catalano, nipote di Leonardo Sciascia[12]
A cura di Gisele
Palmieri
G: Hai ricordi dei pasti con
Leonardo Sciascia?
V: Sì, mio nonno amava mangiar bene. Era un
cuoco eccellente e quando viaggiava sceglieva con cura il ristorante. Era molto
misurato, non mangiava tanto ma appunto voleva mangiar bene. E gli piaceva
condividere con altri il piacere di una buona pietanza (e quindi molto con noi che
eravamo i suoi nipotini).
G: Della cucina tipica siciliana,
quali erano i piatti preferiti di tuo nonno?
V: Amava la cucina siciliana, i piatti della
tradizione familiare e legati alle stagioni: in primavera le fave o gli
asparagi selvatici coi quali condiva la pasta o cucinava le uova; in estate la
caponata o il pitaggiu (un piatto della tradizione di Racalmuto con peperoni,
cipolla, pomodoro, patate); in inverno la salsiccia alla brace o la stigliola
(un altro piatto siciliano). Andava bene anche un semplice piatto di spaghetti
al pomodoro, al quale lui amava aggiungere del peperoncino (gli piacevano i
sapori piccanti).
G: Il pane è una delle parole che
Sciascia ha evidenziato tra le sei che considerava importanti per la sua vita,
oltre a “terra”, “donne”, “mistero”, “giustizia” e “diritto”. Ne Le parrocchie di Regalpetra lo cita più
volte come simbolo della miseria di una Sicilia che era “ancora una terra
amara”. Possiamo dire che Leonardo Sciascia ha fatto delle considerazioni
etiche-sociali anche sul cibo?
V: Sì, possiamo anche dirlo. Dopotutto
l'etica e la società, ma anche il cibo e le tradizioni lo interessavano e
dunque i temi in qualche modo si intrecciavano...
Considerações finais
Por outro lado, percebemos
uma tentativa por parte de familiares e amigos de Sciascia em ativar uma imagem
mais suave e divertida do escritor, como um típico cidadão siciliano, que
apreciava a cultura e a tradição local, resgatando momentos de prazer e
fraternidade à mesa, em sua casa de campo em Racalmuto. Memórias que, por serem
afetivas, nos remetem a uma prazerosa experiência de familiaridade com o
escritor.
Rememorar as experiências
gastronômicas de Leonardo Sciascia e seu gosto pela culinária tipicamente
siciliana, por fim, não o exime de seu olhar crítico às contradições da
realidade insular no âmbito da temática do cibo.
Ao contrário, evidencia uma postura que Sciascia buscava defender para si[13]: a de que era apenas um
homem preocupado com as questões de sua terra, que tentava entender a realidade
que o cercava, portanto não era nenhum especialista em assuntos específicos,
uma espécie de acusação que recebia quando abordava aqueles temas polêmicos os
quais nenhum outro intelectual queria comentar.
Como citar: PALMIERI, Gisele. " Terra e cibo (ou Pane e fame) na produção literária de Leonardo Sciascia", v. 3, n. 1, jan-abr, 2022. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/231806
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
DALLA BONA, Fabiano. “O Prazer Gastronômico No Reino
Das Duas Sicílias: Entre O Sagrado E O Profano Na Representação Literária.”
Tese. Doutorado em Letras Neolatinas. UFRJ, 2001, 171 f. Disponível em: http://www.letras.ufrj.br/pgneolatinas/media/bancoteses/fabianodallabonadoutorado.pdf
RICORDA, Ricciarda. “Pane e Coltello – Leonardo Sciascia
e il cibo”. In: A tavola con le muse.
Immagini del cibo nella letteratura italiana della modernità. A cura di
Ilaria Crotti e Beniamino Mirisola.
Disponível
em:https://edizionicafoscari.unive.it/media/pdf/books/978-88-6969-187-4/978-88-6969-187-4-ch-06.pdf.
SCIASCIA, Leonardo. La Sicilia come
metafora. Milano: Arnoldo Mondadori Editore, 1979.
___________. A
futura memoria: se la memoria ha un futuro. Milano: Adelphi, 2017.
VULLO, Salvatore. Di terra e di cibo.
Fra le pagine di Leonardo Sciascia. Caltanisseta: Salvatore Sciascia Editore, 2014.
[1] Pelo Comite Nazionale Centenario Sciasciano, uma reunião de entidades
públicas, instituições privadas, personalidades públicas e pesquisadores para a
promoção do centenário de nascimento do escritor Leonardo Sciascia, que sob o
título “La patria di Sciascia”, realizou eventos e atividades na Itália e em
outros países em homenagem ao escritor siciliano, decorrer do ano de 2021.
Disponível em: https://www.amicisciascia.it/attivit%C3%A0-e-iniziative/convegni-eventi/item/777-per-i-100-anni-dalla-nascita,-il-comitato-nazionale-inaugura-le-manifestazioni-sciasciane-2021-2023.html.
[2] RICORDA, Ricciarda. “Pane e Coltello – Leonardo Sciascia e il cibo”.
In: A tavola con le muse. Immagini del
cibo nella letteratura italiana della modernità. A cura di Ilaria Crotti e
Beniamino Mirisola. Disponível em:https://edizionicafoscari.unive.it/media/pdf/books/978-88-6969-187-4/978-88-6969-187-4-ch-06.pdf.
VULLO, Salvatore. Di terra e di cibo. Fra
le pagine di Leonardo Sciascia. Caltanisseta: Salvatore Sciascia Editore, 2014.
[3] “La
Sicilia è ancora una terra amara” (SCIASCIA, L. Le parrocchie di Regalpetra. Milano:
Ed. Adelphi, 1991, p. 16).
[4]
Nunca li nada tão triste nas crônicas, frequentemente
desoladoras, do que as histórias que os meninos me contam sobre seus dias. Vejo
a casa úmida e escura daquele bairro de San Nicola, o mais pobre do país; o
menino chorando (e talvez deva ter levado um tapa na cara e ter sido xingado)
pelas duzentas liras que recebera no jogo e que queria gastar sabe-se lá como,
talvez para comprar os cadernos e uma caneta; e o pai que sai para buscar sua
bebida, para se embriagar com o pobre
dinheiro do filho. Nunca, a não ser por meio deste pequeno acontecimento, a
miséria me apareceu em toda a sua essência de cega e maligna bestialidade.
Olhando mais de perto, encontram-se nesse episódio todos os elementos que fazem
a tragédia da nossa vida - e pelo menos da minha vida aqui, neste pobre país. E
no dia da grande festa cristã, que é o pano de fundo e que condiciona esse
episódio, parece tornar-se, por trás desta criança chorando em sua casa escura,
uma blasfema paródia. (Sugestão de tradução).
[5] A cidade
ficava longe da mina de enxofre; a cidade de Francesco Lanza, mas na época eu
não o conhecia, estava lendo Hugo e o Dumas “pai”. Num domingo à tarde, meu pai
me deixou ir à cidade na companhia de um mestre de obras, os operários me
fizeram uma festa, queriam que eu tomasse sorvete e comesse doces. Eles estavam
com suas roupas escuras do serão, sentados do lado de fora do ambiente terroso,
onde se localizava o seu clube ou, como diziam, estavam na reunião de “depois
do trabalho”. No dia seguinte voltava a vê-los na mina de enxofre com os
pedaços de lona atados aos pés e o pão preto - comemos “pão e faca” - diziam,
como a dizer que só comiam pão, no máximo acompanhadas com anchovas salgadas ou
tomate. (sugestão de tradução)
[6] Certa vez, antes do fascismo, os
operários vieram assaltar a escola, queriam nos espancar, mas muitos de nós
estávamos passando fome. Quem não tinha nada vivia de pão e água com o salário. (sugestão de tradução)
[7] A alimentação
destes homens (os trabalhadores das salinas) é quase exclusivamente composta
por hidratos de carbono: pão e cebola crua ou pão e sardinha salgada nas duas
refeições que comem no local de trabalho; à noite, em casa, uma sopa à base de vegetais
e restos de massa; macarrão só aos domingos” (sugestão de tradução)
[8] Por outro lado,
as crônicas não receberam o mesmo consenso entre os colegas de Regalpetra;
alguns até as acharam fantasiosas: um fenômeno bastante compreensível; outros,
embora as considerassem verdadeiras em seu conjunto, me indicaram que certos
detalhes não correspondiam à realidade: o salário dos lavradores hoje não é de
600, mas de 700 liras por dia; a dos mineiros de sal, de 600 e não de 500; e os
meninos não usam mais sandálias de madeira com tiras de couro, e as refeições
escolares não são mais como antes, muitos deixam as tigelas cheias, pegam o pão
e a geleia e deixam intacta a sopa de feijão ou o macarrão. A partir deste
último fato, o colega deduz que não haja mais a fome de antes. Não sei se o
fato de as tigelas permanecerem cheias se deve à saciedade ou a uma repulsa
invencível: as condições de alimentação podem ter melhorado nas famílias; mas é
mais fácil que tenha sido a alimentação escolar a piorar, tornou-se totalmente
impossível comê-la. Em 54-55 eu não frequentei
a merenda escolar; mas já nos anos anteriores a comida era tão repulsiva, que ao entrar na
sala onde estava sendo servida, me surgiu o mau pensamento de que fazer o Exmo.
conselheiro regional engolir uma colherada daquela comida me deixaria feliz,
como contribuinte e como professor. Cada cantina absorve a atividade de um
mestre, exclusivamente neste serviço destacado, e de quatro ou cinco
cozinheiras e atendentes. Se em vez daquela terrível tigela de sopa quente o
conselheiro pensasse em oferecer um almoço menos evanescente de biscoito e
geleia, ou chocolate, ou queijo, os meninos ficariam felizes; e as despesas,
consideravelmente reduzidas. A ideia de um lanche quente é boa: desde que a
coisa quente seja comestível. Espera-se que o novo conselheiro regional da
educação pública, em vez de discorrer sobre o ensaio ginástico da memória staraciana e sobre o canto obrigatório
do hino em Roma (aquele que canta os misini)
conforme seu ilustre predecessor, comece a lidar com coisas mais concretas, e
também com a refeição. (sugestão de tradução)
[9] O ano escolar
acabou. O diretor vai nos encontrar para a despedida, se Deus quiser será o
último encontro, em um ano tivemos uma dúzia deles, e depois tem as chamadas
conferências administrativas. Gostaria de discutir os problemas da escola, e os
problemas da escola seriam os do rádio, do cinema. Seria imperdoável apontar
que aqui existe o problema do pão. ‘O que o pão tem a ver com a escola? Vamos
falar sobre o rádio. Vamos falar sobre cinema.’ Afinal, tudo está como antes. (sugestão de tradução)
[11] (...)a comida como
embaixadora da paisagem mediterrânea e da civilização camponesa, uma chave
importante para a compreensão da dinâmica social e cultural de uma vida
siciliana ainda a ser explorada. (sugestão de tradução)
G: Possui alguma recordação dos momentos das refeições
com Leonardo Sciascia? / V: Sim, meu
avô amava comer bem. Era um cozinheiro excelente e quando viajava escolhia com
cuidado o restaurante. Era muito comedido, não comia muito, mas comia bem. E
gostava de compartilhar com outras pessoas o prazer de uma boa refeição,
principalmente conosco, seus netos.
G: Da culinária típica siciliana, quais eram os pratos
preferidos do seu avô? / V: Amava a
cozinha siciliana, tanto os pratos da tradição familiar quanto os ligados às
estações do ano: na primavera, as favas e os aspargos selvagens com os quais
temperava macarrão ou ovos cozidos; no verão, a caponata ou o pitaggiu (um prato tradicional de Racalmuto que é composto
por pimentão, cebola, tomate, batata); no inverno, linguiça grelhada ou stigliola
(outro prato da Sicília). Apreciava também um simples prato de espaguete com
molho de tomate, ao qual ele gostava de adicionar um pouco de pimenta (gostava
dos sabores picantes).
G: O pão (pane) é uma das
palavras que Sciascia destacou entre aquelas seis que considerava
significativas para a sua vida, assim como terra (terra), mulher (donne), mistério (mistero), justiça (giustizia) e
direito (diritto). Em Le parrocchie
di Regalpetra, ele a menciona diversas vezes como símbolo da miséria de uma
Sicília que era ancora una terra amara.
Podemos dizer que o alimento também recebeu de Leonardo Sciascia considerações
de impegno ético-social? / V: Sim, podemos dizê-lo. Afinal, a ética e a
sociedade, mas também a comida e as tradições o interessavam e, portanto, os
temas de alguma forma se entrelaçavam.
[13] “Non c’è
nulla che mi infastidica quanto l’essere considerato um esperto di mafia, come
oggi si usa dire, un mafiologo. Sono semplicemente uno che è nato, è vissuto e
vive in un paese della Sicilia occidentale e ha sempre cercato di capire la
realtà che lo circonda, gli avvenimenti, le persone. Sono un esperto di mafia
così come lo sono in fatto di agricoltora, di emigrazione, di tradizioni
popolari, di zolfara: a livello delle cose viste e sentite, delle cose vissute
e in parte sofferte.” (SCIASCIA,
2017, p. 47). / Não há nada que me incomode tanto quanto ser considerado um
especialista em máfia ou como se costuma dizer atualmente, um mafiólogo. Sou
simplesmente alguém que nasceu, viveu e vive em uma localidade do oeste da
Sicília e sempre tentei entender a realidade que a cerca, os acontecimentos, as
pessoas. Sou tão perito em máfia quanto sou em agricultura, emigração,
tradições populares e nas minas de enxofre: ao nível das coisas que se veem e
se ouvem, das vividas e, em parte, sofridas. (SCIASCIA, 2017, p. 47, sugestão de tradução).
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