La poesia e la sapienza del mondo, di Marco Ceriani

Estudo do homem - Italo Svevo, por Thiago Teixeira Lopes

Raoul Hausmann, Cabeça mecânica, 1919



Por Thiago Teixeira Lopes* 
(Graduado em Letras/Italiano - FFLCH/USP)


O mais famoso e talvez o mais importante romance de Italo Svevo é, certamente, “A consciência de Zeno”. Na época em que foi publicado (1923), as ideias de Freud, já divulgadas na Europa, não haviam sido sistematicamente exploradas pela literatura, o que fez com que o romance ficasse conhecido pela incorporação dos conceitos da psicanálise, apresentando-nos um narrador-personagem problemático, cheio de atos falhos, má-fé, autossabotagem, ciladas do inconsciente, falhas morais e uma boa dose de masoquismo.

Mas hoje, quando os conceitos psicanalíticos já não são novidade, quando depois de Huxley, Joyce, Foster, Wallace, os malabarismos formais do romance não mais nos chocam, e quando, enfim, os neurocientistas escrevem artigos nos jornais para dizer que a psicanálise é uma ciência velha e ultrapassada, cabe-nos investigar o que n’A consciência de Zeno mantém vivos seu frescor e novidade.

Uma possível proposta talvez se encontre nas palavras de um crítico pouco conhecido (Ferdinando Virdia), num artigo de 1954 do jornal “La voce republicana”:

Svevo deixou em nossa literatura outra herança que não aquela do puro psicologismo ou da análise freudiana aplicada à narrativa, mas sobretudo a concretude e seriedade de uma atitude em direção à vida, a aguda exigência de a estudar não em seu desbotado exterior, mas sim no íntimo entrelaçar-se das relações afetivas resultantes da vida em sociedade, a refutação de uma retórica e de um otimismo decorativo

Quando falamos d’A consciência de Zeno e apontamos suas novidades estilísticas, chamando a atenção para a ironia, para a utilização dos conceitos da psicanálise, para a livre associação de ideias, para o fluxo narrativo, para a revelação sem tabus da intimidade de um pequeno burguês italiano, para as marcas germânicas misturadas com o dialeto triestino, numa escrita sem rigor gramatical, acabamos nos esquecendo de que não basta enumerar tais traços sem que investiguemos a sua finalidade, ou o efeito que provocam. 

Virdia muito sensivelmente percebeu que tais características são recursos de uma literatura cujo objetivo é estudar a vida em seu interior, uma literatura que se preocupou em analisar o íntimo de um homem ante as relações convencionais da vida em sociedade, abandonando o mero psicologismo e, sobretudo, a retorica de um estilo pomposo, bem emoldurado, porém externo e, consequentemente, superficial.

O que fica desse romance é mais do que uma aplicação dos conceitos psicanalíticos: é a maneira como se torna um sincero estudo do homem, sobretudo o homem mediano, doente, neurótico. O homem de má-fé, descrito vinte anos antes que Sartre o colocasse como centro de um sistema filosófico, e que é caracterizado por mentir para si mesmo, negando a responsabilidade pelos seus atos.  


como citar:  LOPES, Thiago Teixeira. Estudo do homem - Italo Svevo. In Literatura Italiana, v.1, n.3. Disponível em

https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/209894