La poesia e la sapienza del mondo, di Marco Ceriani

Nella città di Rossellini, por Mariarosaria Fabris






Sob este título, reuni e traduzi dois segmentos do poema “La ricchezza”, que Pier Paolo Pasolini publicou em La religione del mio tempo (Milano: Garzanti, 1961): “Proiezione al ‘Nuovo’ di ‘Roma città aperta’” (“Projeção no ‘Nuovo’ de ‘Roma, cidade aberta’”, p. 47-48) e “Lacrime” (“Lágrimas”, p. 56-57). [1]


Ma che colpo al cuore, quando, su un liso
cartellone... Mi avvicino, guardo il colore
già d’un altro tempo, che ha il caldo viso
ovale, dell’eroina, lo squallore
eroico del povero, opaco manifesto.
Subito entro: scosso da un interno clamore,
deciso a tremare nel ricordo,
a consumare la gloria del mio gesto.
Entro nell’arena, all’ultimo spettacolo,
senza vita, con grige persone,
parenti, amici, sparsi sulle panche,
persi nell’ombra in cerchi distinti
e biancastri, nel fresco ricettacolo...
Subito, alle prime inquadrature,
mi travolge e rapisce... l’intermittence
du coeur. Mi trovo nelle scure
vie della memoria, nelle stanze
misteriose dove l’uomo fisicamente è altro,
e il passato lo bagna col suo pianto...
Eppure, dal lungo uso fatto esperto,
non perdo i fili: ecco... la Casilina,
su cui tristemente si aprono
le porte della città di Rossellini...
ecco l’epico paesaggio neorealista,
coi fili del telegrafo, i selciati, i pini,
i muretti scrostati, la mistica
folla perduta nel daffare quotidiano,
le tetre forme della dominazione nazista...
Quasi emblema, ormai, l’urlo della Magnani,
sotto le ciocche disordinatamente assolute,
risuona nelle disperate panoramiche
e nelle sue occhiate vive e mute
si addensa il senso della tragedia.
È lì che si dissolve e si mutila
il presente, e assorda il canto degli aedi.

Ecco quei tempi ricreati dalla forza
brutale delle immagini assolate:
quella luce di tragedia vitale.
Le pareti del processo, il prato
della fucilazione: e il fantasma
lontano, in cerchio, della periferia
di Roma biancheggiante in una nuda luce.
Gli spari; la nostra morte, la nostra
sopravvivenza: sopravvissuti vanno
i ragazzi nel cerchio dei palazzi lontani
nell’acre colore del mattino. E io,
nella platea di oggi, ho come un serpe
nei visceri, che si torce: e mille lacrime
spuntano in ogni punto del mio corpo,
dagli occhi ai polpastrelli delle dita,
dalla radice dei capelli al petto:
un pianto smisurato, perché sgorga
prima d’essere capito, precedente
quasi al dolore. Non so perché trafitto
da tante lacrime sogguardo
quel gruppo di ragazzi allontanarsi
nell’acre luce di una Roma ignota,
la Roma appena affiorata dalla morte,
superstite con tutta la stupenda
gioia di biancheggiare nella luce:
piena del suo immediato destino
d’un dopoguerra epico, degli anni
brevi e degni d’un’intera esistenza.
Li vedo allontanarsi: ed è ben chiaro
che, adolescenti, prendono la strada
della speranza, in mezzo alle macerie
assorbite da un biancore che è vita
quasi sessuale, sacra nelle sue miserie.
E il loro allontanarsi nella luce
mi fa ora raggricciare di pianto:
perché? Perché non c’era luce
nel loro futuro. Perché c’era questo
stanco ricadere, questa oscurità.
Sono adulti, ora: hanno vissuto
quel loro sgomentante dopoguerra
di corruzione assorbita dalla luce,
e sono intorno a me, poveri uomini
a cui ogni martirio è stato inutile,
servi del tempo, in questi giorni
in cui si desta il doloroso stupore
di sapere che tutta quella luce,
per cui vivemmo, fu soltanto un sogno
ingiustificato, inoggettivo, fonte
ora di solitarie, vergognose lacrime.


Na cidade de Rossellini


Que golpe no coração: num cartaz desbotado...
Aproximo-me, olho a cor
já de outrora, que tem o cálido rosto
oval, da heroína, o esqualor
heroico desse pobre, opaco anúncio.
Entro logo: tomado de um interno clamor,
decidido a tremer à lembrança,
a consumir a glória de meu gesto.
Adentro o recinto, na última sessão,
sem vida; pessoas apagadas,
parentes, amigos, espalhados nos assentos,
perdidos na sombra em círculos distintos,
esbranquiçados, no fresco receptáculo...
Logo, nos primeiros enquadramentos,
me assalta e me arrasta... l’intermittence
du coeur. Estou nos escuros
caminhos da memória, nos cantos
misteriosos onde o homem fisicamente é outro,
e o passado o banha com seu pranto...
Então, pelo longo uso que me fez esperto,
não perco os fios: eis... a Casilina, [2]
para a qual tristemente se abrem
as portas da cidade de Rossellini...
eis a épica paisagem neorrealista,
seus fios do telégrafo, ruas calçadas, pinheiros,
muretas rachadas, a multidão
mística perdida nos afazeres diários,
as tétricas formas do domínio nazista...
Quase um emblema, agora, o grito da Magnani,
sob as mechas desordenadamente absolutas,
ressoa nas desesperadas panorâmicas
e em seus olhares vivos e mudos
adensa-se o sentido da tragédia.
É lá que se dissolve e se mutila
o presente, e se cala o canto dos aedos.

Eis os tempos recriados pela força
brutal das imagens estouradas:
aquela luz de tragédia vital.
As paredes do processo, o prado
do fuzilamento: e o fantasma
longínquo, ao redor, da periferia
de Roma reluzente em nua brancura.
Os tiros; a nossa morte, a nossa
sobrevivência: sobreviventes vão
os rapazes no círculo dos prédios ao longe
naquela acre cor da manhã. E eu,
na plateia de hoje, sinto ter uma cobra
nas entranhas, que se contorce: e mil lágrimas
brotam de cada ponto de meu corpo,
desde os olhos até a ponta dos dedos,
da raiz do cabelo até o peito:
um pranto desmedido, porque jorra
antes de ser entendido, quase
antes da dor. Não sei por que ferido
por tantas lágrimas espio
o grupo de rapazes afastar-se
na acre luz de uma desconhecida
Roma, que mal aflorou da morte,
sobrevivente na tão estupenda
alegria de reluzir na brancura:
tomada por seu imediato destino
de um pós-guerra épico, dos anos
breves e dignos de toda uma existência.
Vejo-os afastar-se: fica bem claro que,
adolescentes, seguem o caminho
da esperança, entre os escombros
absorvidos por um clarão que é vida
quase sexual, sagrada em suas misérias.
E o seu afastar-se nessa luz
me leva agora a enregelar de pranto:
por que? Porque não havia luz
em seu futuro. Porque havia essa
cansada recaída, essa escuridão.
São adultos, agora: já viveram
esse seu apavorante pós-guerra
de corrupção absorvida pela luz,
e estão ao meu redor, pobres homens
para quem todo martírio foi em vão,
servos do tempo, nesses dias
em que desperta o doloroso espanto
de saber que toda aquela luz,
pela qual vivemos, não passou de um sonho
injustificado, não objetivo, fonte
agora de solitárias, envergonhadas lágrimas.

[1] Tradução extraída do texto autobiográfico “Eu não vi, mas me contaram...”, publicado em Tabuleiro das Letras, Salvador, n. 3, dez. 2011 [recurso eletrônico].
[2] Pasolini refere-se à Via Casilina, estrada que, saindo da Porta Maggiore e percorrendo os campos ao sul de Roma, vai até a cidade de Cápua (antiga Casilinum), na Campânia.



como citar: FABRIS, Mariarosa. Nella città di Rossellini. In Literatura Italiana Traduzida, v.1., n.5, jun. 2020.Disponível em https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/209822