La poesia e la sapienza del mondo, di Marco Ceriani

Tradutor em epitextos virtuais, por Marlene Rodrigues Brandolt






Inúmeras nações e famílias jamais irão esquecer o medo social enfrentado a cada dia deste 2020, em que o mundo se curva diante das manifestações provocadas pelo isolamento do Coronavírus. As imagens terríveis da pandemia tornam as cidades imersas nos silêncios do temor, provocando alterações, uma delas relacionada à economia, aliás, dispositivo que interfere em diferentes áreas da sociedade mundial. Diante do abalo social, as nações passam a falar pela dor, linguagem que une as diversidades culturais que devem determinar a estagnação de algumas produções, o que pode futuramente marcar outras fronteiras relativas ao esquecimento literário. Sem ignorar os conflitos humanos, é possível resistir ao quadro de isolamento social e promover reflexões sobre o deslocamento de literaturas imigrantes que dependem da divulgação editorial impressa e virtual, como a que chega da Itália.
A perspectiva desta análise toma os epitextos virtuais para refletir como o tradutor aparece nas publicidades das obras das escritoras italianas traduzidas no Brasil. O corpus escolhido está vinculado à Elena Ferrante, com o livro Um amor incômodo, de 2017, produzido pela Editora Intrínseca, e à Donatella Di Pietrantonio, com A devolvida, de 2019, publicação da Faro Editora que foi lançada com o título A retornada pela Tag Inéditos no mesmo ano. 

 O termo mencionado como epitexto figura “em qualquer lugar fora do livro”, envolvendo um papel “social virtualmente ilimitado” e pode ser definido na circulação da obra (GENETTE, 2009, p. 303). Conhecimento “que a crítica e a história literária utilizam em larga escala para comentar as obras”, cuja função publicitária, por vezes, não envolve a responsabilidade do autor, considerando antes as necessidades comerciais, segundo diz Gérard Genette em Paratextos editoriais com tradução para o Brasil em 2019 (GENETTE, 2009, p. 305). O filósofo francês não chegou a explorar as ferramentas paratextuais ligadas à mídia e ao tradutor, mas favorece pensar o tradutor no contexto do “autor responsável pela constituição do texto, pela sua gestão, pela sua apresentação” (GENETTE, 2009, p. 265).
Pelas razões sugeridas, o tradutor pode mediar informações acerca da narrativa original, bem como interferir diretamente na interpretação de quem recebe a obra. Porém, na maioria dos blogssites e do acervo digital da Folha de S. Paulo, o tradutor ocupa um lugar semelhante ao da ficha técnica – no livro impresso. Nesse sentido, a modalidade do tradutor não sofre maiores alterações, conforme procedimentos do site da Editora Intrínseca que se limita à apresentação do nome do responsável pela tradução, enquanto destaca o pseudônimo Elena Ferrante, com o qual ela se mantém anônima. Fórmula semelhante tem a página da Editora Faro editorial, na coluna Clássicos, Lançamento, Romance, onde a sugestão para a leitura do livro A devolvida acompanha o nome do tradutor. Já o site de venda da Livraria da Travessa, além de citar, na ficha técnica, o nome de Mario Bresighello como tradutor ao lado do nome da obra de Donatella Di Pietrantônio, também define o título em português e em italiano (L'Arminuta), bem como o gênero – Literatura italiana, o idioma – Português e ano de edição – 2019.

Uma síntese das obras pode ser assim relatada: em Um amor incômodo, de Elena Ferrante, a protagonista Délia, ao perder a mãe, lembra com intensidade dos impactos familiares gerados com a progenitora, passando, então, a resgatar memórias que surgem de forma dolorosa a partir da sua infância. Ela diz: “guardo o horror e o sinto novamente cada vez que alguém nesta cidade abre a boca” (FERRANTE, 2017, p. 146). Donatella Di Pietrantônio, por sua vez, também com enredo familiar no roteiro do livro A devolvida, trata de uma garota de 13 anos que fica “presa entre [...] duas mães”, devendo conviver com elas, ainda que tenham decidido abandoná-la em um determinado momento de suas vidas (PIETRANTONIO, 2019, p. 121). Da experiência de desamparo resulta uma personagem exilada e sem nome, com dificuldade de se reconhecer; conflito com o qual Délia, de Elena Ferrante, também precisa trabalhar. 
As situações discordantes que permeiam as ficções selecionadas fazem parte do site de Fabiane Saches de 19 de novembro de 2017, quando comenta “a dicotomia presença/ausência” que envolve os enredos de Elena Ferrante desde o lançamento do primeiro livro. A página virtual incorpora às informações o título original L’amore molesto, de Um amor incômodo, porém, limita-se a mencionar o nome do tradutor, não fazendo outra nota sobre o mesmo. O mesmo ocorre no blog de Taize Odelli, de 05 de abril de 2018, pois a jornalista fala da editora e da tradução de Marcello Lino do romance citado, mas sem qualquer observação sobre o ato tradutório.
Com leituras virtuais, entre 2016 a 2020, foi possível identificar, na maioria delas, a ausência de notas sobre o tradutor, ainda que, segundo André Lefevere, os responsáveis pela tradução sejam “co-responsáveis [...] pela sobrevivência das obras literárias entre leitores não-profissionais que constituem a grande maioria dos leitores em nossa cultura globalizada” (LEFEVERE, 2007, p. 13-17). Entretanto, no projeto gráfico de paratextos editoriais, tal participação não mostra um avanço em relação ao material impresso, o que reduz tradicionalmente o espaço à folha de rosto e à ficha catalográfica das produções. Essas impressões já foram comentadas, mas é válido ressaltar a ocorrência na coluna Ilustrada da Folha de S. Paulo, de 10 de junho de 2017, definindo apenas o nome do tradutor; em outros endereços, igualmente Lucas Alves, na resenha Um amor incômodo, de 14 de junho de 2017, indica a tradução para o português de Marcello Lino; já Gabriela Mattos, em 24 de janeiro de 2019, não menciona o nome do tradutor, no entanto, aponta para Anita Raja, tradutora, como possibilidade de ser Elena Ferrante; porém, tal fato não é confirmado.
No blog de Natália Coelho, além de mencionar com brevidade a preferência pelo título A devolvida e menos pelo desdobramento A retornada, de Donatella Di Pietrantônio, a jornalista cita o nome de Mario Bresighello como tradutor das duas edições. Ponto de destaque para a ação tradutória fica a cargo da apresentação de Donatella Di Pietrantônio, na PUCRS, em 29 de outubro de 2019, para divulgação do livro A Devolvida, em que o anúncio remete à conversa em italiano, com a tradução de um intérprete. Um diferencial na abordagem do tradutor encontra-se em Um Café com Luke, de 15 de abril de 2019, quando ele escreve sobre o livro A retornada. Ali cita o nome do tradutor, fala do projeto gráfico da edição, que reproduz “muito bem o clima de toda a história[1]”, a qual é ambientada no ano de 1975.
Na sequência das informações, em seu blog, Luke reporta-se à capa, chamando atenção para a opção da cor azul marinho, bem como expõe um lembrete do tradutor que aparece nas notas de rodapé no livro impresso; uma delas explica a alusão feita pela personagem a uma brincadeira "em que alguém tem de agarrar uma bandeira ou uma cauda de coelho ou raposa". Em outro trecho, a nota ilustra o relato sobre o termo diplomático: "Doce em forma retangular feito com massa de pão de ló..." (PIETRANTONIOI, 2019, p. 22-107 (N. do T.)). Com as designações epitextuais, o jornalista situa o tradutor no processo de divulgação da obra, permitindo-lhe interação com o leitor, que passa a ser favorecido com uma interpretação semântica dos termos inseridos no quadro cultural da língua de partida.
Sem subestimar a natureza poética das obras, a ideia manteve uma continuidade acerca do tradutor no repositório do epitexto, cuja presença não é um fator isolado da intenção de quem escreve. Nesse sentido, o processo de recepção dessa categoria faz parte do contexto de escritoras, críticas, com recomendações de literatura, conforme estabelecido no site de Thaís Rigolon, em que ela busca, na figura da tradutora, caminhos de leituras para 2018. Interessante dizer que, no mapeamento de indicações com participantes de 29 países, Elena Ferrante, da Itália, aparece entre os nomes de Virginia Woolf (Inglaterra); Chimamanda Ngozi Adichie (Nigéria); Alice Munro (Canadá); Hilda Hilst (Brasil); Lucia Berlin (Estados Unidos)”. Atualmente as parcerias estabelecidas com os links especializados em literatura mostram um movimento menor, cujo desenrolar de projetos gráficos deve retomar fora das intempéries provocadas pela Covid-19, crise que abalou a política cultural do mercado livreiro, o qual depende também de ações econômicas estabelecidas pelo governo.
Apesar do cenário de estremecimento cultural, alguns sites mantêm os espaços de difusão das obras com dicas de leituras, sobretudo de Um amor incômodo, para o período de quarentena[2] e os demais comentados permitem constatar a redução da linguagem tradutória, que está fora de esclarecimentos da cultura de saída e de chegada. Diante do serviço da tradução e da responsabilidade do quadro de endereços eletrônicos com as literaturas indicadas, outras metas podem ser inseridas em trabalhos futuros numa análise comparativa entre o tradutor e demais elementos paratextuais, a saber, a capa e o ilustrador, os três vistos, sobretudo, como articuladores de vendas e edições do livro de escrita italiana no Brasil.



[1] LUKE. A retornada. Um café com Luke, 15 abr. 2019. Disponível em: <https://umcafecomluke.wordpress.com/?s=Donatella+Di+Pietrantonio>. Acesso em: 20 jan. 2020.


[2] Para citar: CAMILA. Livros interessantes para devorar durante a quarentena, abr. 2020. Disponível em: <https://www.muitochique.com/dicas/livros-interessantes.html>. Acesso em: 03 maio 2020.

Referências

ALVES, Lucas. [Resenha] Um amor incômodo, Sem Serifa, 14 jun. 2017. Disponível em: <https://blogsemserifa.com/2017/06/14/resenha-um-amor-incomodo/>. Acesso em: 14 jan. 2020.
COELHO, Natália. Tag inéditos #3: A Retornada. Quarto.ato cultura sem ponto final, 18 abr. 2019. Disponível em: <http://www.quartoato.com/2019/04/tag-ineditos-3-retornada-identidade.html>. Acesso em: 20 dez. 2019.
DI PIETRANTONIO, Donatella. A retornada. Tradução de Mario Bresighello. São Paulo: Faro Editorial, 2018.
DI PIETRANTONIO, Donatella. A devolvida. Tradução de Mario Bresighello. São Paulo: Faro Editorial, 2019. 
EDITORA Faro. A devolvida. Disponível em: <faroeditorial.com.br>. Acesso em: 09 abr. 2020.
 EDITORA Intrínseca. Um amor incômodo - Elena Ferrante.  Disponível em: <www.intrinseca.com.br>. Acesso em: 10 abr. 2020.
FERRANTE, Elena. Um amor incômodo. 1. ed. Tradução de Marcello Lino. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2017.
FOLHA DE S. PAULO (2016 a 2019). Edição impressa. Disponível em: <https://www.folha.uol.com.br//>. Acesso em: 12 abr. 2019.
GENETTE, Gérard. Paratextos editoriais. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009.
LEFEVERE, André. Tradução, reescrita e manipulação da fama literária. Tradução de Claudia Matos Seligmann. Bauru: EdUSC, 2007.
LIVRARIA da Travessa. A devolvida. 1. ed., 2019. Disponível em: <https://www.travessa.com.br/a-devolvida-1-ed-2019/artigo/660f7ee6-5a76-4ac7-8fe9-c76d4d2019f8>. Acesso em: 24 mar. 2020.
 LUKE. A retornada. Um café com Luke, 15 abr. 2019. Disponível em: <https://umcafecomluke.wordpress.com/?s=Donatella+Di+Pietrantonio>. Acesso em: 20 jan. 2020.
 MATTOS, Gabriela. Reflexões sobre ‘Um amor incômodo’. Blog.estantevirtual, 24 jan. 2019. Disponível em: <blog.estantevirtual.com.br>. Acesso em: 10 fev. 2020.
ODELLI, Taize. Um amor incômodo – resenha, 05 abr. 2018. Disponível em: <https://rizzenhas.com>. Acesso em: 15 maio 2020.
 PUCRSEscritora Donatella Di Pietrantonio apresenta na PUCRS o livro A Devolvida. Disponível em: http://www.pucrs.br/blog/escritora-donatella-di-pietrantonio-apresenta-o-livro-a-devolvida-na-pucrs/. Acesso em: 12 dez. 2019.
RIGOLON, Thaís. Mulheres para ler em 2018. Estudos Sobre Cultura e Comunicação, 11 fev. 2018. Disponível em: <https://culturaecomunicacao.com.br/2018/02/11/mulheres-para-ler-em-2018/>. Acesso em: 30 mar. 2020.
SECCHES, Fabiane. Elena Ferrante: autora ou personagem? Cult, 14 nov. 2017. Disponível em: <https://revistacult.uol.com.br/home/elena-ferrante-autora-ou-personagem/>.  Acesso em: 20 jan. 2020.


como citar: BRANDOLT, Marlene Rodrigues. Tradutor em epitextos virtuais. In Literatura Italiana Traduzida, v.1., n.6, jun. 2020.Disponível em

https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/209776